quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

Vencer o medo e atravessar a ponte

Nao tive a ponte do ano novo, nao sei se acredito nessa inteligente e subliminar forma de nos empenhar em nossas próprias vidas e em condiçoes sociais que nos façam acreditar que a vida é feita de etapas. Ainda mais agora, com o vivenciar sereno da mudança de datas...

Era o que pensava quando, às 5h, me levantei, rodei por todo o hostel em busca de Taís e voltei para a cama, até que ouvisse algum barulho.

Como nao ouvia nada, às 6h me levantei de novo e a vi no computador. Em nossa conversa rápida, percebemos que já tínhamos perdido o ônibus das 6h e que precisaríamos tentar pegar o das 7h.

Volei ao quarto, organizei as poucas coisas que tinha deixado pra arrumar na manha, paguei a noite de dormida, registrei a saída do hostel e fomos para o rodoviária.

Aí, percebemos que nao havia, como indicava o panfleto, um outro ônibus, às 7h. Teríamos que ir, às 8h para Uspallata e, de lá, egar outro ônibus, ao meio-dia e meia para Puente del Inca.

Aproveitamos o tempo para comer e conversar um pouco sobre nossos trabalhos de pesquisa, eu, do meu mestrado, e, ela, do seu doutorado.

Seguimos conversando em uma parte da viagem e dormimos até começarmos a ver as montanhas da Cordilheira dos Andes, algumas nevadas.

Perto de 10h30min. chegamos a Uspallata. Tínhamos exatamente duas horas para tentar conhecer o "pueblo" e alguma coisa que a cidade tivesse para oferecer. Resolvemos pegar umas bicletas e fazermos um percurso de dois quilômetros e meio.

O caminho era lindo! O clima estava perfeito! A companhia era agradável! Inclusive a de um cachorro que me escolheu como dono desde o momento em que chegamos na rodoviária e me lambeu a perna. Desde esse momento, nao nos abandonou até a hora de ir embora.

Andávamos de um lado para outro e o cachorro estava ao lado, fomos de bicicleta até as Bóvedas (uma construçao de inspiraçao moura, usada pelos espanhóis para fundir metais preciosos), e o cachorro estava aí.

Taís tinha os joelhos doendo e se sentia insegura com a bicicleta, por isso, demoramos um pouco na ida. Mas, na volta, já inebriados um da energia do outro, já bem felizes de termos perdido o ônibus das 6h, pela oportunidade de estarmos naquele lugar, juntos e sob os pés daquelas lindas montanhas, viemos mais rápido. Além disso, era preciso chegar a tempo de comprar passagens, comer alguma coisa e ir para Puente del Inca.

Depois de tudo isso feito, pegamos o ônibus e fomos ao destino previsto anteriormente. Quando chegamos aí, mais uma vez sentimos a energia das montanhas e nos abraçamos diante daquele monumento esculpido na pedra (a ponte do Inca).

Taís queria conseguir logo um quarto para passar a noite. Mas, o tempo para mim era curto. Precisava voltar no ônibus das 16h50min. para Mendoza, onde pegaria o ônibus das 22h15min. para Córdoba. Por isso, optamos em começar a nossa caminhada de 4km ladeira acima em direçao ao Aconcágua.

Logo depois do local em que está sediado Puente del Inca, havia que passar uma ponte bem alta. Todos que me conhecem sabem que eu morro de medo de altura e, para passar aquela ponte, sobre um penhasco com um rio abaixo, com tremores todas as vezes que os carros e caminhoes em direçao ao porto de Valdívia passavam, tinha que passar por sobre mim mesmo.

Mas, certo de que queria chegar ao Aconcágua, diminuí o passo. Algumas vezes, perdi a concentraçao em relaçao às montanhas no horizonte e olhei para baixo, mas, nao me deixei abater. Segui adiante.

Até certo ponto, eu e Taís andamos juntos, pedimos carona, até que, de repente, ela começou a andar mais lentamente. Imaginei que fosse por causa do cansaço. Falei com ela sobre a possibilidade de irmos mais devagar, mas ela me pediu para continuar que ela me acompanharia em seguida.

Enquanto caminhava, olhava o tempo, sentia vontade de continuar e, ao mesmo tempo, me preocupava com Taís. Também, já estava morto, mas, devido aos dias anteriores de caminhada exaustiva, me sentia melhor preparado fisicamente para caminhar. E, mesmo que quisesse pedir carona, Taís viria logo atrás e nao a deixaria só.

Neste ínterim, encontrei um casal de argentinos que vinha caminhando para baixo. Pedi informaçoes sobre a distância e, diante do que eles disseram, continuei. Por um momento, quando estava bem perto da entrada do parque do Aconcágua e já podia ver a montanha pelo seu lado, dei conta de que Taís nao subia, de que ela nao vinha.

Algumas pessoas que faziam o percurso em moto, pararam e perguntei sobre a possibilidade de a terem visto na estrada. Mas, o grupo de brasileiros motociclistas nao a havia visto. Isso me deu mais preocupaçao e resolvi descer. Tirei algumas fotos da visao que tinha do Aconcágua e voltei.

Quando cheguei no "pueblo", Taís estava aí, bem próxima ao casal de argentinos que tinha visto na estrada. Me disse que a altitude estava afetando seu ouvido e perguntou se tinha conseguido e chegar ao Aconcágua. Quando disse que nao por causa das preocupaçoes com ela, ela pediu desculpas, lamentou..., mas o melhor era que a gente tinha passado um dia lindo.

Sobre o casal de argentinos, estes, que já tinham andado mais de 4h pela estrada, pediam carona para outro pueblo mais abaixo, até começamos a conversar e lhes disse que o ônibus direto para Mendoza passaria em 50min.

Na conversa descobri que se chamavam Jerónimo e Jael. Estudavam, respectivamente, arquitetura e psicologia, na Universidade de Córdoba. Jerónimo e Jael eram um novo encontro de vida. Descobri isso enquanto esperávamos o önibus e, em seguida, durante todo o percurso de volta a Mendoza. Eram pessoas maravilhosas, simpáticas, amigáveis e muito envolvidas com lutas sociais.

Durante a viagem, trocamos endereços de e-mail, conversamos um pouco mais e tentamos descansar. Afinal, o dia tinha sido puxado e eu, ainda iria correr até o hostel para pegar as coisas e voltar pra rodoviária.

De qualquer modo, deu pra perceber que Jerónimo e Jael sao loucos pra conhecer o Brasil, que têm uma preocupaçao com seu país e com o futuro da América Latina. Queriam saber do governo Lula, me falavam de seu governo...

Depois de me despedir de Jerónimo e Jael, tive uma sensaçao de perda incrível. Nao sabia porquê, já que só tínhamos nos conhecido há pouco mais de 3 ou 4h. Mas, me sentia mal. Talvez, seja por isso que deva continuar acreditando na existência de (re)encontros e nao de encontros de vida.

Em 20 min, enquanto pensava na grandeza do encontro com o casal de argentinos e no dia que havia passado com Taís, cheguei ao hostel. Todos os que trabalhavam aí precem ter resolvido se encontrar. Pelo menos, pude me despedir de todos os "hermanos" argentinos com quem tinha tido uma convivência fantàstica nos últimos dias.

Tomei um banho e saí. Enquanto isso, fui cumprimentado efusivamente por todos que, me desejavam sorte, boas viagens... diante disso, lamentava o fato de ter que seguir, mas, mais uma vezes, sabia que precisava que seguir. E lamentava também o fato de nao ter conseguido me despedir dos amigos franceses e de, sequer, ter pego seus endereços de e-mail para seguir com a comunicaçao.

De qualquer forma, foi bom ter as marcas deles, agora, em minhas marcas.

No caminho para a rodoviária, outra marca. Agora a de Florência, que muito simpaticamente me acompanhou. Era a primeira vez que seguia para o terminal de ônibus por aquele lugar e estava meio sem saber se fazia certo. Ela prontamente me ajudou. Conversamos um pouco e nos despedimos, desenjando-nos sorte.

Florência era a certeza que será o caminho que me fará conhecer pessoas, que fará construir novas marcas.

Nenhum comentário: