quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

A viagem para Buenos Aires

A solidao da viagem para Buenos Aires só se rompia quando, em algum momento de parada, Sergio e Susana viam conversar comigo.
Mais uma vez, eram só perguntas. Parecia que as minhas idéias, a minha vida, geravam muita curiosidade neles. A própria Susana na hora do almoco reconheceu isso. Ela dizia que, todo o tempo, só me faziam perguntas e nunca me deixavam comer. Isso porque, no café-da-manha tinha sido assim, porque naquele momento do almoco estava sendo assim e em qualquer parada, mínima que fosse, estava sendo assim.
Eu nao me incomodava. Eu estava adorando conhecer gente tao bonita, apesar de serem, aparentemente mais elitizados, menso envolvidos com questoes mais críticas e com as discussoes sobre política.
Como estavam quase sem dinheiro, devido a extorsao, Susana e Sergio quase nao comiam. Aproveitavam o lanche que haviam servido no onibus e economizavam. Por diversas vezes, ofereci comida, dinheiro... mas eles nao queriam.
Eu sabia que nao tinha muito, mas nao podia deixá-los com fome. Seriam, pelo menos, mais 12 horas de viagem.
No almoco, voltamos a nos reunir e, como vi que eles nao tinham nada pra comer, nem dinheiro, os convidei para almocar. Meio com vergonha, eles aceitaram, mas nao quiseram pedir nada que fosse caro. Resultado, pagamos 18 pesos e comemos bem os tres.
Mais adiante, próximo a Buenos Aires, Susana me envia um bilhete, se colocando a disposicao em Buenos Aires e chamando para sair no final de semana.
Acho que tinha sido esta a forma que encontram de selar aquele nosso encontro.
Quase 21h chegamos a rodoviária do Retiro, no centro de Buenos Aires. Aí, nos despedimos calorosamente com a promessa de que nos encontraríamos e me fui.
Queria novamente caminhar em Buenos Aires. Queria novamente ver as pessoas de Buenos Aires, interagir com Buenos Aires... por isso, optei em ir até o Clan, hostel em que fiquei logo que iniciei esta viagem.
Quando cheguei aí, nao havia vagas, mas ao ver que me conseguiram um lugar para dormir, e ao rever Owen, Nacho, Leandro... fui povoado de um sentimento profundo.
Nao sabia explicar, mas me sentia uma outra pessoa. Era como se, agora, pudesse olhar para aquele lugar e para mim mesmo de forma completamente diferente.
Conversava com Nacho, contava as experiencias... estava entusiasmado e ele também se entusiasmava com minhas histórias.
Era bom. Tudo era bom!
Mas, precisava, depois de dois dias sem um banho, precisava organizar as coisas e lavar a alma. Tirei tudo o que precisava lavar, organizei minha mochila, tomei um banho e desci para escrever.
Queria reviver Potosí, para retomar o que havia deixado inacabado, queria reviver a viagem para falar de Sergio e de Susana.
Ao mesmo tempo, queria falar com a minha casa e me sentir novo diante da voz de minha mae.
Estranho, mas, quando falava com minha mae, esta sensacao passou. Nao sei se tinha medo de sentir o que eu sentia, se achava que tudo o que sentia se perderia com a volta a casa... ou se tinha medo porque, naquele momento, iria assumir uma acao que poderia nao gostar, a de ter mascado folha de coca na Bolívia. O motivo era verdadeiro, mas nao sabia o que iria pensar.
Eu sempre gosto de dizer a verdade aos meus pais e de assumir as coisas que faco. Mas, em alguns momentos eles interpretam meus atos de forma equivocada.
Vendo que minha mae nao teve qualquer reacao adversa, me senti mais tranquilo para pensar, para refletir e para escrever.
Quando consegui o computador, toda a sensacao de antes me tomou de novo. Principalmente, porque havia e-mails de Susana, de Javier, de Nora.
Li tudo, respondi e, povoado de sensibilidade, me pus a escrever.
Assim, estou as 4h20min da manha.

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