quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

A "saudade" em Valdívia

Meu último dia em Valdívia... quando penso na Noite de Natal, nas pessoas lindas que conheci no Aires Buenos, como Yesi, Germán, que trabalham aí...

Me sinto como estava no meu último dia em Buenos Aires... tinha vontade de dar continuidade a minha caminhada, mas me sentia bem no lugar em que estava e só me dava vontade de passar todo o dia desfrutando da companhia das pessoas, sentir a casa...

Mas, tinha uma necessidade... meus pés estavam cheio de bolhas por tentar caminhar de havaianas, de tênis e de sandálias, todos calcados inapropriados para se passar o dia na rua caminhando. Entao, resolvi comprar um sapato específico para isso.

Depois, quando voltei para o hostel, Tim, Tim me chamou para visitar o museu de história de Valdívia. Nao tava muito afim, mas para nao passar o dia enchendo o saco de Germán e Yesi, resolvi ir. O pior foi que nao consegui me despedir de Yesi. Fiquei muito triste por isso.

Apesar de ter ido, minha cabeca nao estava para museus. A ansiedade por voltar era maior do que a minha capacidade de apreciar as coisas que o museo tinha pra oferecer. Mas, Tim queria comprar uma mochila térmica pra colocar comida, queria consertar seus óculos de sol, o que fez com que o retorno para o hostel se alongasse mais.

Na casa, Germán lava a louca quando me perguntou qual o signifcado da palavra "saudade". Parece que todo mundo quer conhecer a beleza de nossa palavra saudade. Passei alguns minutos tentando retratar a complexidade dessa palavra, que representa sentimentos tao profundos e diversos. Da saudade que pode vir acompanhada da tristeza ou da alegria, que pode ser nostalgia, melancolia, mas que pode nao ser nada disso. Pode ser simplesmente a consciência alegre da existência de alguém. Pode ser a saudade de um tempo, de alguma coisa...

Bom, em espanhol, normalmente, as pessoas quando querem falar da falta que alguém faz, diz extrañar, echar de menos, sentir nostalgia, melancolia, añoranza..., a nossa saudade é tudo isso junto, tantava dizer.

lembrei que Renata tinha me recomendado um filme (Azul Profundo) que tinha no acervo do hostel, e comecei a vê-lo.

Quando Renata volta, tive que interromper o filme porque ela queria que a ajudasse com sua mochila até a rodoviária. Como ela teve um acidente e nao pode carregar peso, nao me furtei a isso. À parte, seria um modo de conversarmos um pouco mais.

Em alguns minutos, já estava de volta e, por instantes, fiquei só assistindo à televisao. Quando percebi que o filme estava ainda na metade e só tinha mais 1h30min para tomar banho e ir pra rodoviária, resolvi que o melhor seria fazer tudo isso logo e aproveitar um pouco mais da companhia das pessoas.

Tudo organizado, já estava quase indo para a rodoviária (que é bem perto do hostel) quando percebi que ainda tinha tempo. O próprio Germán, que estava com uma amiga, Verónica, propôs que nao fosse ainda. Aí me dei conta de que tocava música brasileira. Samba, mais especificamente.

Neste instante, Germán me pediu pra dizer a Verónica o sentido de "saudade"... ficamos aí falando sobre isso de novo por longos poéticos minutos. Isso, talvez, fez Verónica sentir-se triste, pensativa... até que comecamos uma outra conversa, agora, sobre a facilidade da vida...

Evidentemente, nao podia concordar completamente com isso. Para algumas pessoas, a vida é muito difícil. É preciso conquistar cada minuto. É preciso conquistar o ato de viver. Para essas pessoas, a vida é muito difícil. Nao há sonho, porque o sonho é apenas poder viver o próximo minuto, o próximo dia. Ninguém que vive assim, talvez, consiga planejar e revolver seus pensamentos em torno de idéias abstratas, de que se fazem os sonhos...

Seus sonhos sao a concretude...

Germán ficou pensando nisso e mudou de idéia... Verónica, de certo modo, concordou comigo também...

Nao sei porque, em algum momento comecamos uma conversa sobre a minha própria vida e, quando contava como difícil estudar, como foi difícil ter meu próprio escritório, como foi difícil essa viagem, Verónica me fez a pergunta que muitas pessoas devem estar fazendo agora: como esse cara está viajando por tantos lugares sem dinheiro? Por que fala tanto em dificuldades se pega o dinheiro que nao tem e emprega numa viagem como essa?

Nao sei se consegui, mas tentei explicar para Verónica que há pessoas que buscam acumular dinheiro para ter coisas, enquanto outras, pensam apenas em viver melhor, em conhecer pessoas, em absorver o conhecimento que a interrelacao humana pode promover.

É esta a intencao que me move, saber que posso, enquanto ser humano, construir novas formas de pensar e de viver a partir de experiências que me tornem mais conhecido por mim mesmo. Era uma necessidade, a descoberta da minha identidade latinoamericana. É uma questao política!

Para completar o que estas palavras poderiam trazer consigo, me despedi de Germán e de Verónica cantando a nossa Cancao da América, que, de forma simples, permite a integracao e a amizade.

Em seguida, saí noite a fora até a rodoviária... estava acompanhado dos meus pensamentos e da saudade de Valdívia.

Nenhum comentário: