A viagem já começou

Estou a programar uma parte da viagem com que sonho faz três anos. Para situar você que está lendo, o meu sonho está em sair sem rumo certo pelos países da América Latina até o México..., sem tempo certo também. Agora, por algumas dificuldades, não posso fazer isso. Então, decidi que iria fazer uma parte desta viagem em 41 dias. Meu percurso seria por cinco países: Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai. Mas, não sei se tudo isso vai ser possível em tão pouco tempo... A verdade é que esta viagem já começou, embora esteja programada para a próxima sexta-feira, dia 14 de dezembro o seu início físico. Afinal, minha cabeça, meus sentidos, meus sentimentos, minha sensibilidade..., tudo está volvido à construção desse intento. Até pensar em espanhol já comecei. Esta semana, inclusive, sonhei duas vezes na língua dos povos que, apesar de próximos, não estão reconhecidos em nossa sociedade, como não está reconhecida a nossa latinoamericanidade. Aliás, poucos de nós consegue perceber-se latinoamericano, tem o sentimento de latinoamericanidade aflorado. Costumo dizer que estamos com o olhar voltado para o alto, em oração, como se Deus estivesse na Europa; com a cabeça povoada de norteamericanismo, já que os Estados Unidos pairam sobre nossas cabeças, promovendo influências desastrozas em nossa cultura; temos diante de nós o nosso alterego, a África, e, simplesmente, desprezamos a América Latina, para quem estamos de costas. Percebi isso quando tive contato com paraguaios e argentinos durante todo o ano de 2005. Aliás, foi esse mesmo "encontro" que me fez perceber que havia algo mais a descobrir, que tenho identificado como uma necessidade de encontrar pessoas, de encontrar culturas, de encontrar humanidades. Como não seria possível "encontrar-se" com outros e deixar de "encontrar-se" consigo mesmo, porque somos quem estamos sendo, exatamente, à medida que vamos absorvendo novas marcas em nossas marcas, conferidas pelos nossos "encontros" com as pessoas, suponho que este "encontro" com seres humanos da América Latina produzirá um novo ser-estar-sendo.
Para que este intento se materialize, no entanto, fui obrigado a abrir e fechar ciclos de reflexão, fazer um mergulho sobre minha própria cultura, iniciar o processo de abertura ao "novo-presente", porque, em tese, me sinto voltado para a novidade, mas sem a abertura necessária terei um olhar julgador, um olhar chauvinista, inclinado a achar tudo o que já habita em meu estar-sendo como melhor. Precisava e preciso analisar minha vida, minhas buscas, minha relação com os direitos humanos e com as pessoas. Precisava estabelecer contato com o projeto de sociedade e de vida ao qual me inclino, avaliá-lo, mergulhar no meu mundo para descobrir as possibilidades de um novo encontro com o mundo. Agora, apesar de imaginar que só o vivenciar da própria experiência é que vai me permitir reconhecer um novo contato com o mundo, compreendo que estou pronto para caminhar... Afinal, como diz Paulo Freire, "o caminho se faz caminhando".